quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Samba e amor, leite derramado

“Com o tempo aprendi que o ciúme é um sentimento para proclamar de peito aberto, no instante mesmo de sua origem. Porque ao nascer, ele é realmente um sentimento cortês, deve ser logo oferecido à mulher como uma rosa. Senão, no instante seguinte ele se fecha em repolho, e dentro dele todo o mal fermenta. O ciúme é então a espécie mais introvertida das invejas, e mordendo-se todo, põe nos outros a culpa de sua feiura.”

Matilde

"Debaixo do chuveiro eu agora me olhava quase com medo, imaginando em meu corpo toda a força e a insaciedade do meu pai. Olhando meu corpo, tive a sensação de possuir um desejo potencial equivalente ao dele, por todas as fêmeas do mundo, porém concentrado numa só mulher."

Matilde

"... no entanto, eu não sabia mais me libertar de Matilde, procurava adivinhar seus movimentos mais íntimos e seus pensamentos tão distantes".

terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Fullgás

Nada de novo sob o sol: saio, agora, a fim de umas geladas e de uma conversa boa, à toa. Afinal, mais vale um bocado com prazer, do que dois com fadiga. No sol de dezembro, eu vou: um copo na mão e algumas ideias na cabeça.

Trazer agora o futuro para já

A verdade tem seu tempo e o tempo, suas verdades. Se eu dissesse que meu esforço é trazer agora o futuro para já, isso tem muitos desdobramentos. Se fosse frase de Clarice seria a busca de um instante-já. Mas se fosse pronunciada hoje, anonimamente, poderia ser tão melancólica que melhor seria não dizer nada. Quando digo "farei", "verei", "gozarei", tudo isto é dito num presente, é claro. Mas esse “trazer o futuro para o presente” pode ser duplicado, pois parece que hoje o futuro já não vem, ele é sempre adiado e o que resta é um eterno e não terno presente que perece e não passa. O futuro não vem porque já é. E continuará. Talvez quiséssemos palavras mais exatas, mas elas não nos bastam. Incharam de tão vazias. Se fossem onomatopéias, imitariam outro som, e se isto não é suficiente seria pelo menos um indício, uma metáfora, outras palavras, um outro. É preciso dizer que a verdade pode ser também atemporal, tal como o tempo tem das suas mentiras. Entre um e outro, jogo de xadrez com a morte, vivemos.

domingo, 23 de dezembro de 2012

Ciência e arte

Mais Platão, menos Prozac

Ao raro leitor, os desejos sinceros de um 2013 mais belo, mais lleno, vida melhor, enfim. Mais Platão, menos Prozac, mais música no coração, menos banalidade. Mais romance, menos namoro camisa de força, para provarmos que existe Amor em São Paulo, nos Campos Elíseos, nos Gerais, no Sertão-mundo de nossa ausência-presença.

Um sonho de valsa, um corte de cetim

domingo, 9 de dezembro de 2012

Oscar Niemeyer, a Veja online e o Escaravelho


09/12/2012
 
Com a morte de Oscar Niemeyer aos 104 anos de idade ouviram-se vozes do mundo inteiro cheias de admiração, respeito e reverência face a sua obra genial, absolutamente inovadora e inspiradora de novas formas de leveza, simplicidade e elegância na arquitetura. Oscar Niemeyer foi e é uma pessoa que o Brasil e a humanidade podem se orgulhar.
E o fazemos por duas razões principais: a primeira, porque Oscar humildemente nunca considerou a arquitetura a coisa principal da vida; ela pertence ao campo da fantasia, da invenção e do lúdico. Para ele era um jogo das formas, jogado com a seriedade com que as crianças jogam.
A segunda, para Oscar, o principal era a vida. Ela é apenas um sopro, passageira e contraditória. Feliz para alguns mas para as grandes maiorias cruel e sem piedade. Por isso, a vida impõe uma tarefa que ele assumiu com coragem e com sérios riscos pessoais: a da transformação. E para transformar a vida e torná-la menos perversa, dizia, devemos nos dar as mãos, sermos solidários uns para com os outros, criarmos laços de afeto e de amorosidade entre todos. Numa palavra, nós humanos devemos aprender a nos tratar humanamente, sem considerar as classes, a cor da pele e o nível de sua instrução.
Isso foi que alimentou de sentido e de esperança a vida desse gênio brasileiro. Por aí se entende que escolheu o comunismo como a forma e o caminho para dar corpo a este sonho, pois, o comunismo, em seu ideário generoso, sempre se propôs a transformação social a partir das vítimas e dos mais invisíveis. Oscar Niemeyer foi um fiel militante comunista.
Mas seu comunismo era singular: no meu modo de ver, próximo dos cristãos originários pois era um comunismo ético, humanitário, solidário, doce, jocoso, alegre e leve. Foi fiel a esse sonho a vida inteira, para além de todos os avatares passados pelas várias formas de socialismo e de marxismo.
Na medida em que pudemos observar, a grande maioria da opinião pública mundial, foi unânime na celebração de sua arte e do significado humanista de sua vida. Curiosamente a revista VEJA de domingo, dedica-lhe 10 belas páginas. Outra coisa, porém, é a revista VEJA online de 7 de dezembro com um artigo do blog do jornalista Reinado Azevedo que a revista abriga.
Ele foi a voz destoante e de reles mau gosto. Até agora a VEJA não se distanciou daquele conteúdo, totalmente, contraditório àquele da edição impressa de domingo. Entende-se porque a ideologia de um é a ideologia do outro. Pouco importa que o jornalista Azevedo, de forma confusa, face às críticas vindas de todos os lados, procure se explicar. Ora se identifica com a revista, ora se distancia, mas finalmente seu blog é por ela publicado.
Notoriamente, VEJA se compraz em desfazer as figuras que melhor mostram nossa cultura e que mais penetraram na alma do povo brasileiro. Essa revista parece se envergonhar do Brasil, porque gostaria que ele fosse aquilo que não é e não quer ser: um xerox distorcido da cultura norte-americana. Ela dá a impressão de não amar os brasileiros, ao contrário expõe ao ridículo o que eles são e o que criam. Já o titulo da matéria referente a Oscar Niemeyer da autoria de Azevedo, revela seu caráter viciado e malevolente: ”Para instruir a canalha ignorante. O gênio e o idiota em imagens”. Seu texto piora mais ainda quando, se esforça, titubeante, em responder às críticas em seu blog do dia 8/12 também na VEJA online com um título que revela seu caráter despectivo e anti-democrático:”Metade gênio e metade idiota- Niemeyer na capa da VEJA com todas as honras! O que o bloco dos Sujos diz agora?” Sujo é ele que quer contaminar os outros com a própria sujeira de uma matéria tendenciosa e injusta.
O que se quer insinuar com os tipos de formulação usados? Que brasileiro não pode ser gênio; os gênios estão lá fora; se for gênio, porque lá fora assim o reconhecem, é apenas em sua terceira parte e, se melhor analisarmos, apenas numa quarta parte. Vamos e venhamos: Quem diz ser Oscar Niemeyer um idiota apenas revela que ele mesmo é um idiota consumado. Seguramente Azevedo está inscrito no número bem definido por Albert Einstein: ”conheço dois infinitos: o infinito do universo e o infinito dos idiotas; do primeiro tenho dúvidas, do segundo certeza”. O articulista nos deu a certeza que ele e a revista que o abriga possuem um lugar de honra no altar da idiotice.
O que não tolera em Oscar Niemeyer que, sendo comunista, se mostra solidário, compassivo com os que sofrem, que celebra a vida, exalta a amizade e glorifica o amor. Tais valores não cabem na ideologia capitalista de mercado, defendida por VEJA e seu albergado, que só sabe de concorrência, de “greed is good”(cobiça é coisa boa), de acumulação à custa da exploração ou da especulação, da falta de solidariedade e de justiça em nível internacional.
Mas não nos causa surpresa; a revista assim fez com Paulo Freire, Cândido Portinari, Lula, Dom Helder Câmara, Chico Buarque, Tom Jobim, João Gilberto, frei Betto, João Pedro Stédile, comigo mesmo e com tantos outros. Ela é um monumento à razão cínica. Segue desavergonhadamente a lógica hegeliana do senhor e do servo; internalizou o senhor que está lá no Norte opulento e o serve como servo submisso, condenado a viver na periferia. Por isso tanto a revista quanto o articulista revelam um completo descompromisso com a verdade daqui, da cultura brasileira.
A figura que me ocorre deste articulista e da revista semanal, em versão online, é a do escaravelho, popularmente chamado de rola-bosta. O escaravelho é um besouro que vive dos excrementos de animais herbívoros, fazendo rolinhos deles com os quais, em sua toca, se alimenta. Pois algo semelhante fez o blog de Azevedo na VEJA online: foi buscar excrementos de 60 e 70 anos atrás, deslocou-os de seu contexto (ela é hábil neste método) e lançou-os contra Oscar Niemeyer. Ela o faz com naturalidade e prazer, pois, é o meio no qual vive e se realimenta continuamente. Nada de surpreendente, portanto.
Paro por aqui. Mas quero apenas registrar minha indignação contra esta revista, em versão online, travestida de escaravelho por ter cometido um crime lesa-fama. Reproduzo igualmente dois testemunhos indignados de duas pessoas respeitáveis: Antonio Veronese, artista plástico vivendo em Paris e João Cândido Portinari, filho do genial pintor Cândido Portinari, cujas telas grandiosas estão na entrada do edifício da ONU em Nova York e cuja imagem foi desfigurada e deturpada, repetidas vezes, pela revista-escaravelho.

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Oscar Niemeyer e a imprensa tupiniquim- Antonio Veronese

Crítica mesquinha, que pune o Talento, essa ousadia imperdoável de alçar os cornos acima da manada. No Brasil, Talento, como em nenhum outro país do mundo, é indigerível por parte da imprensa, que se acocora, devorada por inveja intestina. Capitania hereditária de raivosos bufões que já classificou a voz de Pavarotti de ruído de pia entupida; a música de Tom Jobim de americanizada; João Gilberto de desafinado e Cândido Portinari de copista…
Quando morre um homem de Talento, como agora o grande Niemeyer, os raivosos bufões babam diante do espelho matinal sedentos de escárnio.
Não discuto a liberdade da imprensa. Mas a pergunta que se impõe é como um cidadão, com a dimensão internacional de Oscar Niemeyer, (sua morte foi reverenciada na primeira página de todos os grandes jornais do mundo) pode ser chamado, por um jornalista mequetrefe, num órgão de imprensa de cobertura nacional, de metade-gênio-metade idiota? Isso após sua morte, quando não é mais capaz de defender-se, e ainda que sob a desculpa covarde, de reproduzir citação de terceiros…
O consolo que me resta é que a História desinteressa-se desses espasmos da estupidez. Quem se lembra hoje dos críticos da bossa nova ou de Villa-Lobos? Ao talent, no entanto, está reservada a reverência da eternidade.

Antonio Veronese (mideart@gmail.com)





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Meu caro Antonio,
Que beleza o seu texto, um verdadeiro bálsamo para os que ainda acreditam no mundo de amanhã nascendo do espírito, da fé e do caráter dos homens de hoje!
Não é toda a imprensa, felizmente. Há também muita dignidade e valor na mídia brasileira. Mas não devemos nos surpreender com a revista semanal. Em termos de vileza, ela sempre consegue se superar. Ela terá, mais cedo ou mais tarde, o destino de todas as iniquidades: a vala comum do lixo, onde nem a história se dará o trabalho de julgá-la.
Os arquivos do Projeto Portinari guardam um sem número de artigos desta rancorosa revista, assim como de outras da mesma editora, sobre meu pai, Cândido Portinari e outros seus companheiros de geração. Sempre pérfidos, infames e covardes, como este que vem agora tentar apequenar um grande homem que para sempre enaltecerá a nossa terra e o nosso povo.
Caro amigo, é impossível ficar calado, diante de tanta indignidade.

Com o carinho e a admiração do
Professor João Candido Portinari (portinari@portinari.org.br)

*Leonardo Boff é filósofo, teólogo, escritor e comisionado da Carta da Terra.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Clarice Anas

"a explicação de um enigma é a repetição do enigma. O que És? e a resposta é: És."

Del Bosque e o futebol brasileiro

UOL Esporte: Você concorda que a seleção da Espanha é melhor do mundo hoje?
Vicente Del Bosque: Claro que sim, é evidente que sim. É só se fixar nos dados, nos feitos. Estamos numa época muito boa na Espanha e os títulos demonstram isso.



Acho que temos que esperar um pouquinho para ver como Neymar se sairá no nível internacional. Não há nada o que se falar mal dele, tem um grande talento. Mas ainda falta respaldo para ele ser um dos melhores do mundo





UOL Esporte: A Espanha sempre foi um país com clubes fortes, mas sem uma seleção competitiva. Existe uma explicação para agora ter uma equipe tão forte?
Del Bosque: Acho que principalmente porque os jogadores têm o espírito competitivo que é necessário. Nos clubes eles sempre ganharam grandes títulos, sempre tivemos equipes competitivas e finalmente isso foi refletido para a seleção. E também porque na Espanha aconteceram coisas que tiveram consequências positivas.  Até a saída de jogadores para o exterior e de técnicos também influenciou nisso. Na Inglaterra foram alguns. Vieram nomes estrangeiros também, técnicos muito bons. Isso mexeu com o nosso futebol. Claro que temos uma geração muito boa, mas tivemos grandes jogadores antes. Teve um fator também que foi importante: acho que esquecemos um pouco aquela febre de disciplina tática. Agora há um equilíbrio, demos mais espaço para o talento dos jogadores. E vejo que temos uma situação boa para o futuro. Vejo nesses jogadores atuais nomes que poderão ser bons técnicos para o futuro, para levar isso adiante.

UOL Esporte: Durante a sua entrevista coletiva no evento do sorteio da Copa das Confederações você foi muito questionado sobre a instabilidade da seleção brasileira. Existe algo que a Espanha atual pode ensinar para o Brasil?
Del Bosque: Foi raro mesmo ser perguntado sobre a seleção brasileira. Como se eu tivesse a chave para resolver os problemas. Tampouco tenho a solução para o futebol do Brasil. Sempre parece que as seleções que ganham criam uma tendência. Nós somos assim, pelos nossos jogadores, pela posse de bola, acabamos marcando agora essa tendência. Mas não é o único caminho para conseguir o êxito. De fora, vocês brasileiros viram os títulos da seleção, os do Barcelona, os do Real Madrid. Então o futebol espanhol tem uma imagem boa e isso é evidenciado em situações como esse, quando se pergunta.  Ser uma tendência é positivo, não posso negar.

UOL Esporte: E como você viu a troca de técnico na seleção brasileira? É algo que acontece muito no Brasil, na seleção e nos clubes.
Del Bosque: Acontece o mesmo na Espanha. É uma pena que se troque muito de técnicos, algo ruim, mas faz parte. O importante é que o dirigente acredite no técnico, que os jogadores acreditem no trabalho dele. Se isso não acontece é impossível. Aí vem a mudança. O desgaste da convivência com o jogador diária, uma mudança mal feita são coisas que vão minando, por exemplo, a força do técnico. A solução para o dirigente é trocar.

Foi raro ser perguntado sobre a seleção brasileira aqui. Como se eu tivesse a chave para resolver os problemas. Tampouco tenho a solução para o futebol do Brasil. Criamos uma tendência, mas não é o único caminho para conseguir o êxito
UOL Esporte: Quem é, na sua opinião, o melhor jogador do mundo hoje?
Del Bosque: Difícil. Essas escolhas são difíceis. Nós, na seleção espanhola, decidimos, acreditando que precisamos também de um respaldo individual para os nossos jogadores, escolher os dois capitães, Casillas e Xavi, e o Iniesta. Votamos nesses três para o prêmio da Fifa e é justo. É uma questão racional. Não é por isso que eu fecho os olhos para o que fazem Messi e [Cristiano] Ronaldo. São duas feras do futebol.

UOL Esporte: E o Neymar, você acha que ele está no mesmo nível dos melhores do mundo?
Del Bosque: Acho que ainda falta respaldo, mais jogos internacionais para ele ainda, até mesmo com a seleção. Neymar tem condições fantásticas. É um talento.

UOL Esporte: No Brasil, existe uma discussão sobre se ele pode ser o melhor do mundo atuando aqui. O que você acha?
Del Bosque: Difícil falar, mas me lembro do caso do Robinho, por exemplo. Quando ele chegou na Europa tinha grandes condições, e ele tem de verdade, mas o seu rendimento não foi de acordo com o que se esperava. Então tem que esperar um pouco, para saber se a personalidade do Neymar e o seu caráter farão com que ele seja um dos grandes. O Cristiano Ronaldo e o Messi são muito bons, mas além disso são competitivos. Eles ajudam os seus times a ganhar, o que é o mais importante.

UOL Esporte: E vendo jogos do Neymar você o analisa como um jogador competitivo?
Del Bosque: Sim, mas só acho que temos que esperar um pouquinho para ver como ele se sairá no nível internacional, de seleção. Agora mesmo não há nada o que se falar mal do Neymar.

UOL Esporte: No Real Madrid você trabalhou com muitos brasileiros. Que recordações tem deles?
Del Bosque: Foram extraordinários. Me lembro do Flávio Conceição, por exemplo. Contratamos quando eu estava lá. Ele era um jogador muito completo, gostava dele. O Roberto Carlos foi outro. Para mim é o melhor lateral-esquerdo da história. Não houve outro melhor que ele na posição. Era ofensivo, um físico incrível. Jogávamos com o Zidane por dentro e ele tinha a liberdade para avançar. Era incrível o que fazia. O Ronaldo também encantava. Foi um jogador singular, não haverá outro.

Roberto Carlos é o melhor lateral-esquerdo da história. Não houve outro melhor que ele na posição. Era ofensivo, tinha um físico incrível.
UOL Esporte: O Ronaldo gostava de treinar no Real Madrid?
Del Bosque: Acho que sim (risos). Não tenho queixas do Ronaldo. Ele fazia as coisas que mais gostava que era jogar e treinar também. Fomos exigentes como devíamos ter sido com ele. Eu também acho que cada jogador tem ser tratado de forma individual, com cobranças distintas. Tivemos uma boa relação. Além do mais, ele é um garoto muito inteligente, conhece as coisas, as pessoas. Ele capta muito tudo rápido.

UOL Esporte: Vocês ainda se falam?
Del Bosque: Não, só em eventos como aqui. Vi que está fazendo uma dieta, né?. Espero que seja feliz.

UOL Esporte: A Espanha vive um momento incrível no futebol. A seleção é a melhor do mundo. Real Madrid e Barcelona têm os melhores jogadores do mundo. Ao mesmo tempo o país vive uma crise econômica fortíssima, com aumento no desemprego e sem crescimento econômico. Isso é assunto tratado na seleção? O que se fala da crise econômica no país?
Del Bosque: Claro que esse acaba sendo um assunto no time. Não estamos alheios ao que acontece. Os jogadores são sensíveis. Todos conhecem alguém, mesmo na família, que está passando por problemas. Isso é conversado. Esperamos que seja uma situação transitória, que se resolva. Tudo na vida tem solução. Não somos a única grande nação que enfrenta esse problema. Levará um tempo, mas sairemos dessa situação.

UOL Esporte: Você acha que seria uma injustiça o Xavi terminar a carreira sem ganhar o título de melhor jogador do mundo?
Del Bosque: Eu acho que mais importante que o prêmio que ele poderia ter recebido é a consideração que ele tem dos seus colegas. Mais, a consideração que ele tem dos rivais, seja na Espanha ou em outros lugares. Isso ninguém tira dele. O Xavi é o melhor meia do mundo, tem valores geniais. É um meia perfeito. Ele colabora defensivamente, constrói o jogo, faz gols. É um jogador completo.

UOL Esporte: O ex-técnico da seleção brasileira, Mano Menezes, armou o time nos seus últimos jogos sem um camisa “9”. Você acha que é uma influência da seleção espanhola?
Del Bosque: Eu acho que o que eu falava em criar tendência...isso também não é regra. Isso depende dos jogadores que você tem. Se você tem um "9", um centroavante muito bom, quais os meias que você tem...cada time é um mundo de opções.

UOL Esporte: Se você tivesse o Ronaldo no seu time, jogaria com um “9”?
Del Bosque: (risos) Eu sempre joguei com o Ronaldo quando ele estava bem. Ele é um jogador universal, jogaria onde fosse, de atacante, meia, até lateral. Era um especialista como “9”, mas podia atuar onde quisesse. Mas, sim, ele jogaria no meu time.

UOL Esporte: No Brasil se iniciou uma campanha pelo Guardiola na seleção brasileira. Você acha que ele teria sucesso?
Del Bosque: Olha, eu dei umas declarações sobre ele e pareceu que eu estava dizendo o que ele deveria fazer. Eu disse que ele deveria voltar a treinar. Mas eu respeito a sua decisão. Ele tem o direito de decidir e saber o que quer. O que eu disse é porque ele representa muito bem os treinadores da Espanha, faz o seu trabalho de forma brilhante. Fico feliz que tenhamos treinadores dessa qualidade. Ele se daria bem em qualquer lugar. Mas o Brasil tem um técnico, o Luiz Felipe Scolari.

UOL Esporte: Como um técnico com história no Real Madrid consegue viver em paz com o Barcelona numa Espanha que é tão dividida entre os dois clubes?  
Del Bosque: Eu trato de fazer as coisas na maior justiça. Eu não nego o meu clube, onde me criei, fiquei 36 anos e defendi até a morte, que é o Real Madrid. Mas agora sou técnico da Espanha e não tenho preferência por nenhum clube. E o que me faz escolher são os jogadores, o que eles estão fazendo.

UOL Esporte: Existem movimentos políticos que reivindicam que a Catalunha se torne um país independente da Espanha. O próprio presidente da Generalitat (governador da Catalunha), Artur Mas, defende a separação. Se isso acontecesse, certamente a sua seleção perderia quase metade dos jogadores (Xavi, Busquests, Puyol, Fábregas, Jordi Alba, Martín Montoya). O que você acha disso?
Del Bosque: Mesclar política com o esporte não é o melhor.  Hoje a Catalunha é Espanha e trabalho com essa situação. Não acredito que isso vai mudar. Enquanto eu tiver de técnico não vai mudar e trabalho com essa realidade.

Dois a sós

      Para Leyla Perrone-Moisés, Improviso de Ohio é uma peça "singular no universo de Beckett”. Se as personagens beckettianas são sempre solitárias e se relacionam num regime de sadomasoquismo ou mediante uma relação mestre/escravo, em “Improviso de Ohio” não há nenhuma agressividade ou crueldade; pelo contrário, o que aí se narra é elevado. Trata-se de um amor que foi feliz: “amor por/de alguém que já morreu e envia outro para confortar o que ficou”. Segundo Perrone-Moisés, este texto pertence ao gênero clássico chamado ''consolatio''. Beckett, em plena condensação poética, trata do amor sem sentimentalismos, reduzindo tudo ao essencial.
      Porém, certamente, o melhor do artigo está na explicação para a nova tradução, já que Haroldo de Campos e Maria Helena Kopschitz já tinham realizado outra anteriormente. Como o texto tinha versões de Beckett em inglês e francês, Leyla afirma que sua tradução está mais próxima do texto em francês, ao contrário da tradução anterior. Isso permite, por exemplo, encontrar outras soluções para traduzir expressões como “alone together”, que em francês virou “seuls ensemble”. Campos e Kopschitz traduziram por ''a sós juntos''. Já Perrone-Moisés preferiu aproveitar alguns versos de Fernando Pessoa : ''Hoje, falho de ti, sou dois a sós, / Há almas pares, as que conheceram / Onde os seres são almas./ Como éramos só um, falando! Nós / Éramos como um diálogo numa alma. / Não sei se dormes (...) calma, / Sei que, falho de ti, estou um a sós''.

O bilingüismo de Beckett

Em Beckett, impressiona, indiscutivelmente, o seu peculiar bilingüismo. Ele oscila entre duas línguas e traduz a si mesmo. Tudo atrelado às dificuldades de uma prosa que, tocada por um narrador que se põe em xeque a cada passo, rarefaz o enredo, dissolve os personagens, abandona a pontuação, abraça a elipse e a repetição como procedimentos. Fundamental notar que Beckett é um escritor que se fixou numa língua que não é a sua. Há aí, sem dúvida, todo um afã de despersonalização. Para Ferreira Gullar, Beckett é apenas um "chatola". Para outros escritores, há a percepção (menos superficial) de que a escrita de Beckett visa a uma lógica fria, a um distanciamento que dificilmente ele chegaria se escrevesse em sua língua materna.

Beckett e Artaud

Luiz Fernando Ramos fez, certa feita, uma interessante aproximação entre Antonin Artaud e Samuel Beckett. Por um lado, Beckett tem um verdadeiro culto à palavra. Por outro, Artaud escreve que “o mais urgente não me parece tanto defender uma cultura cuja existência nunca salvou qualquer ser humano de ter fome e da preocupação de viver melhor, mas extrair, daquilo que se chama cultura, idéias cuja força viva é idêntica à da fome”. Artaud defende uma “poesia no espaço, independente da linguagem articulada” cuja encenação seria metafísica e alquímica contra “a ditadura exclusiva da palavra”. Dois posicionamentos bem distantes. Porém, havia em ambos a busca de uma nova escritura que tivesse por objetivo incorporar a materialidade mesmo da cena. Se Beckett procurou trazê-la a partir das palavras e principalmente através da rubricas, Artaud, por sua vez, buscava uma despalavra cujas possibilidades de realização não estavam no cérebro do autor, “mas na própria natureza”, “no espaço real”. Segundo Ramos, "Beckett buscou inscrever na palavra o corpo da cena. Artaud pretendeu revelar o corpo da cena com a invenção de uma nova palavra".

Ladeira da Preguiça (1973)

Mr. Sganzerla (Gilberto Gil) - Copacabana Mon Amour

Toca da Raposa

Em 2007, a Volks faturou 21 bilhões de reais no Brasil, com crescimento de 33% nas vendas. Sabe-se que, se dependesse somente de suas vendas na América do Norte ou na Europa, a empresa alemã estaria no vermelho. Mesmo assim os descuidos com o consumidor brasileiro são enormes. Não podemos esquecer do caso "Fox", modelo produzido desde 2003, que apresenta defeitos como uma tal trava que serve para ampliar o espaço do bagageiro, mas também tem como virtude decepar os dedos dos desavisados que a acionam. Como se vê, o aumento da produção automobilística não causa só a amputação do tempo, mas também outras mutilações. E assim, seguimos: uma bancarrota blues da expansão da economia ...

Ciência e Arte

Tu és meu Brasil em toda a parte
Quer na ciência ou na arte
Portentoso e altaneiro
Os homens que escreveram tua história
Conquistaram tuas glórias
Epopéias triunfais
Quero neste pobre enredo
Reviver glorificando os homens teus
Levá-los ao panteon dos grandes imortais
Pois merecem muito mais

Não querendo levá-los ao cume da altura
Cientistas tu tens e tens cultura
E neste rude poema destes pobres vates
Há sábios como Pedro Américo e César Lattes.


(Cartola e Carlos Cachaça)

Verdades e mentiras

É bom falar mal do capitalismo. Fácil. Ao fazermos, entendemos como ninguém o significado da expressão "lavar a alma". Discursamos, nos inflamamos contra as injustiças da vida, como se nosso discurso pudesse representar um fio, um pequeno elo de organização neste mundo tão descrente de tudo, mundo, mundo, sem rima, sem solução, mundo grande sem porteira. O difícil mesmo é quando vivenciamos o tal "sistema". É sempre mais cruel. Nada fácil. Carnadura, cidade, realidade oca, coxa, capenga. Nunca me esqueço de um personagem, se não me engano interpretado por Javier Bardem, de Segunda-Feira ao Sol, filme espanhol que desbancou o badaladíssimo Fale com Ela, de Almodóvar, na busca do Oscar de melhor filme estrangeiro, naquele já longínquo ano de 2002. Ele se lamentava do fato de que todas as promessas feitas em nome do socialismo se mostraram grandes mentiras. Mas constatava o pior: tudo o que foi prometido pelo capitalismo era de fato verdade.